domingo, 22 de março de 2009

Conto de Fadas


Eu trago-te nas mãos o esquecimento

Das horas más que tens vivido, Amor!

E para as tuas chagas o ungüento

Como que sarei a minha própria dor.



Trago no nome as letras duma flor...

Foi dos meus olhos garços que um pintor

Tirou a luz para pintar o vento...



Dou-te o que tenho: o astro que dormita,

O manto dos crepúsculos da tarde,

O sol que é de oiro, a onda que palpita.



Dou-te, comigo, o mundo que Deus fez!

- Eu sou Aquela de quem tens saudade,

A princesa do conto: "Era uma vez..."

Florbela Espanca

sábado, 14 de março de 2009

Lágrimas ocultas

Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era querida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...
E a minha triste boca dolorida,
Que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!
E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim...
E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!
Florbela Espanca




domingo, 8 de março de 2009

Parabéns a todas as mulheres pelo seu dia!

"Toda mulher é doida. Impossível não ser. A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar nosso poder de sedução para encontrar 'the big one', aquele que será inteligente, máculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais... Uma tarefa que dá para ocupar uma vida, não é mesmo?
Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. também é louca. E fascinante..."
Trecho da crônica "Doidas e Santas" da escritora Martha Medeiros.

Um feliz dia das mulheres!

quinta-feira, 5 de março de 2009

Súplica


Olha pra mim, amor, olha pra mim;
Meus olhos andam doidos por te olhar!
Cega-me com o brilho de teus olhos
Que cega ando eu há muito por te amar.
O meu colo é arrninho imaculado
Duma brancura casta que entontece;
Tua linda cabeça loira e bela
Deita em meu colo, deita e adormece!
Tenho um manto real de negras trevas
Feito de fios brilhantes d'astros belos
Pisa o manto real de negras trevas
Faz alcatifa, oh faz, de meus cabelos!
Os meus braços são brancos como o linho
Quando os cerro de leve, docemente...
Oh! Deixa-me prender-te e enlear-te
Nessa cadeia assim eternamente! ...
Vem para mim,amor...Ai não desprezes
A minha adoração de escrava louca!
Só te peço que deixes exalar
Meu último suspiro na tua boca!...
Florbela Espanca

terça-feira, 3 de março de 2009

Amar


Eu quero amar, amar perdidamente!

Amar só por amar: Aqui...além...

Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente Amar!

Amar!E não amar ninguém!


Recordar? Esquecer? Indiferente!...

Prender ou desprender? É mal? É bem?

Quem disser que se pode amar alguém

Durante a vida inteira é porque mente!


Há uma Primavera em cada vida:

É preciso cantá-la assim florida,

Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!


E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada

Que seja a minha noite uma alvorada,

Que me saiba perder... pra me encontrar...


Florbela Espanca

domingo, 1 de março de 2009

OS MEUS VERSOS

Rasga esses versos que eu te fiz, amor!
Deita-os ao nada, ao pó, ao esquecimento,
Que a cinza os cubra, que os arraste o vento,
Que a tempestade os leve aonde for!

Rasga-os na mente, se os souberes de cor,
Que volte ao nada o nada de um momento!
Julguei-me grande pelo sentimento,
E pelo orgulho ainda sou maior!…

Tanto verso já disse o que eu sonhei!
Tantos penaram já o que eu penei!
Asas que passam, todo o mundo as sente…
Rasgas os meus versos…
Pobre endoidecida!
Como se um grande amor cá nesta vida
Não fosse o mesmo amor de toda a gente!…

Florbela Espanca - A mensageira das violetas